O céu amanheceu da cor que ele queria. A cor preferida daquele moço quase vô. Era avô mesmo sem ter netos. Ele ouvia isso sempre que saía à rua (por isso não gostava de sair à rua).
- Quer ajuda, vô?
- Não está muito pesado, vô?
- Eu já chamo o elevador pro senhor, vô!
Que coisa pedante! Mas o céu estava da cor dos olhos dele, e isso muito o agradava. Era uma pena que quase não enxergasse muito bem os próprios olhos no espelho. Achava bonito aquele par de íris e aquelas pupilas daquele jeito.
Estava chegando a hora. Enfim o dia mais esperado do ano vinha aparecendo pela janela. Logo iria morar onde quis tanto e por tanto tempo. Sair daquele prédio enfim, tão grande e com tanta gente faladeira. Ele gostava do silêncio, embora gostasse da cor da fachada também. Era isso que o mantinha naquele lugar: a cor da fachada. Deixou um bilhetinho na mesa da cozinha, caso alguém sentisse a falta dele. Era um avô sem netos, quem poderia sentir falta de um avô sem neto nenhum? Mas mesmo assim, era só por precaução.
Assinou e foi-se embora.
O céu se pintou com um cinza cor de suicídio pra combinar com o dia.
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